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segunda-feira, 14 de junho de 2010

Ser negro no Brasil hoje-Por Milton Santos(By:Ana Nery)

Ética enviesada da sociedade branca desvia enfrentamento do problema negro

Milton Santos


Há uma frequente indagação sobre como é ser negro em outros lugares, forma de perguntar, também, se isso é diferente de ser negro no Brasil. As peripécias da vida levaram-nos a viver em quatro continentes, Europa, Américas, África e Ásia, seja como quase transeunte, isto é, conferencista, seja como orador, na qualidade de professor e pesquisador. Desse modo, tivemos a experiência de ser negro em diversos países e de constatar algumas das manifestações dos choques culturais correspondentes. Cada uma dessas vivências foi diferente de qualquer outra, e todas elas diversas da própria experiência brasileira. As realidades não são as mesmas. Aqui, o fato de que o trabalho do negro tenha sido, desde os inícios da história econômica, essencial à manutenção do bem-estar das classes dominantes deu-lhe um papel central na gestação e perpetuação de uma ética conservadora e desigualitária. Os interesses cristalizados produziram convicções escravocratas arraigadas e mantêm estereótipos que ultrapassam os limites do simbólico e têm incidência sobre os demais aspectos das relações sociais. Por isso, talvez ironicamente, a ascensão, por menor que seja, dos negros na escala social sempre deu lugar a expressões veladas ou ostensivas de ressentimentos (paradoxalmente contra as vítimas). Ao mesmo tempo, a opinião pública foi, por cinco séculos, treinada para desdenhar e, mesmo, não tolerar manifestações de inconformidade, vistas como um injustificável complexo de inferioridade, já que o Brasil, segundo a doutrina oficial, jamais acolhera nenhuma forma de discriminação ou preconceito.

500 anos de culpa

Agora, chega o ano 2000 e a necessidade de celebrar conjuntamente a construção unitária da nação. Então é ao menos preciso renovar o discurso nacional racialista. Moral da história: 500 anos de culpa, 1 ano de desculpa. Mas as desculpas vêm apenas de um ator histórico do jogo do poder, a Igreja Católica! O próprio presidente da República considera-se quitado porque nomeou um bravo general negro para a sua Casa Militar e uma notável mulher negra para a sua Casa Cultural. Ele se esqueceu de que falta nomear todos os negros para a grande Casa Brasileira. Por enquanto, para o ministro da Educação, basta que continuem a frequentar as piores escolas e, para o ministro da Justiça, é suficiente manter reservas negras como se criam reservas indígenas. A questão não é tratada eticamente. Faltam muitas coisas para ultrapassar o palavrório retórico e os gestos cerimoniais e alcançar uma ação política conseqüente. Ou os negros deverão esperar mais outro século para obter o direito a uma participação plena na vida nacional? Que outras reflexões podem ser feitas, quando se aproxima o aniversário da Abolição da Escravatura, uma dessas datas nas quais os negros brasileiros são autorizados a fazer, de forma pública, mas quase solitária, sua catarse anual?

Hipocrisia permanente

No caso do Brasil, a marca predominante é a ambivalência com que a sociedade branca dominante reage, quando o tema é a existência, no país, de um problema negro. Essa equivocação é, também, duplicidade e pode ser resumida no pensamento de autores como Florestan Fernandes e Octavio Ianni, para quem, entre nós, feio não é ter preconceito de cor, mas manifestá-lo. Desse modo, toda discussão ou enfrentamento do problema torna-se uma situação escorregadia, sobretudo quando o problema social e moral é substituído por referências ao dicionário. Veja-se o tempo politicamente jogado fora nas discussões semânticas sobre o que é preconceito, discriminação, racismo e quejandos, com os inevitáveis apelos à comparação com os norte-americanos e europeus. Às vezes, até parece que o essencial é fugir à questão verdadeira: ser negro no Brasil o que é? Talvez seja esse um dos traços marcantes dessa problemática: a hipocrisia permanente, resultado de uma ordem racial cuja definição é, desde a base, viciada. Ser negro no Brasil é frequentemente ser objeto de um olhar vesgo e ambíguo. Essa ambiguidade marca a convivência cotidiana, influi sobre o debate acadêmico e o discurso individualmente repetido é, também, utilizado por governos, partidos e instituições. Tais refrões cansativos tornam-se irritantes, sobretudo para os que nele se encontram como parte ativa, não apenas como testemunha. Há, sempre, o risco de cair na armadilha da emoção desbragada e não tratar do assunto de maneira adequada e sistêmica.

Marcas visíveis

Que fazer? Cremos que a discussão desse problema poderia partir de três dados de base: a corporeidade, a individualidade e a cidadania. A corporeidade implica dados objetivos, ainda que sua interpretação possa ser subjetiva; a individualidade inclui dados subjetivos, ainda que possa ser discutida objetivamente. Com a verdadeira cidadania, cada qual é o igual de todos os outros e a força do indivíduo, seja ele quem for, iguala-se à força do Estado ou de outra qualquer forma de poder: a cidadania define-se teoricamente por franquias políticas, de que se pode efetivamente dispor, acima e além da corporeidade e da individualidade, mas, na prática brasileira, ela se exerce em função da posição relativa de cada um na esfera social.

Costuma-se dizer que uma diferença entre os Estados Unidos e o Brasil é que lá existe uma linha de cor e aqui não. Em si mesma, essa distinção é pouco mais do que alegórica, pois não podemos aqui inventar essa famosa linha de cor. Mas a verdade é que, no caso brasileiro, o corpo da pessoa também se impõe como uma marca visível e é frequente privilegiar a aparência como condição primeira de objetivação e de julgamento, criando uma linha demarcatória, que identifica e separa, a despeito das pretensões de individualidade e de cidadania do outro. Então, a própria subjetividade e a dos demais esbarram no dado ostensivo da corporeidade cuja avaliação, no entanto, é preconceituosa.

A individualidade é uma conquista demorada e sofrida, formada de heranças e aquisições culturais, de atitudes aprendidas e inventadas e de formas de agir e de reagir, uma construção que, ao mesmo tempo, é social, emocional e intelectual, mas constitui um patrimônio privado, cujo valor intrínseco não muda a avaliação extrínseca, nem a valoração objetiva da pessoa, diante de outro olhar. No Brasil, onde a cidadania é, geralmente, mutilada, o caso dos negros é emblemático. Os interesses cristalizados, que produziram convicções escravocratas arraigadas, mantêm os estereótipos, que não ficam no limite do simbólico, incidindo sobre os demais aspectos das relações sociais. Na esfera pública, o corpo acaba por ter um peso maior do que o espírito na formação da socialidade e da sociabilidade.

Peço desculpas pela deriva autobiográfica. Mas quantas vezes tive, sobretudo neste ano de comemorações, de vigorosamente recusar a participação em atos públicos e programas de mídia ao sentir que o objetivo do produtor de eventos era a utilização do meu corpo como negro -imagem fácil- e não as minhas aquisições intelectuais, após uma vida longa e produtiva. Sem dúvida, o homem é o seu corpo, a sua consciência, a sua socialidade, o que inclui sua cidadania. Mas a conquista, por cada um, da consciência não suprime a realidade social de seu corpo nem lhe amplia a efetividade da cidadania. Talvez seja essa uma das razões pelas quais, no Brasil, o debate sobre os negros é prisioneiro de uma ética enviesada. E esta seria mais uma manifestação da ambiguidade a que já nos referimos, cuja primeira consequência é esvaziar o debate de sua gravidade e de seu conteúdo nacional.

Olhar enviesado

Enfrentar a questão seria, então, em primeiro lugar, criar a possibilidade de reequacioná-la diante da opinião, e aqui entra o papel da escola e, também, certamente, muito mais, o papel frequentemente negativo da mídia, conduzida a tudo transformar em "faits-divers", em lugar de aprofundar as análises. A coisa fica pior com a preferência atual pelos chamados temas de comportamento, o que limita, ainda mais, o enfrentamento do tema no seu âmago. E há, também, a displicência deliberada dos governos e partidos, no geral desinteressados do problema, tratado muito mais em termos eleitorais que propriamente em termos políticos. Desse modo, o assunto é empurrado para um amanhã que nunca chega.

Ser negro no Brasil é, pois, com frequência, ser objeto de um olhar enviesado. A chamada boa sociedade parece considerar que há um lugar predeterminado, lá em baixo, para os negros e assim tranquilamente se comporta. Logo, tanto é incômodo haver permanecido na base da pirâmide social quanto haver "subido na vida".

Pode-se dizer, como fazem os que se deliciam com jogos de palavras, que aqui não há racismo (à moda sul-africana ou americana) ou preconceito ou discriminação, mas não se pode esconder que há diferenças sociais e econômicas estruturais e seculares, para as quais não se buscam remédios. A naturalidade com que os responsáveis encaram tais situações é indecente, mas raramente é adjetivada dessa maneira. Trata-se, na realidade, de uma forma do apartheid à brasileira, contra a qual é urgente reagir se realmente desejamos integrar a sociedade brasileira de modo que, num futuro próximo, ser negro no Brasil seja, também, ser plenamente brasileiro no Brasil.

Artigo escrito por Milton Santos, geógrafo, professor emérito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP

Fonte: Folha de S.Paulo - Mais - brasil 501 d.c. - 07 de maio de 2000

Os gêmeos que fizeram a Morte dançar.-Por Milson Onilèétoo




Na velha aldeia de Ifá tudo transcorria normalmente.
Todos faziam seu trabalho,
as lavouras davam seus bons frutos,
os animais procriavam,
crianças nasciam fortes e saudáveis.
Mas um dia
a Morte resolveu concentrar ali sua colheita.
Aí tudo começou a dar errado.
As lavouras ficaram inférteis,
as fontes e correntes de água secaram,
o gado e tudo o que era bicho de criação definharam.
Já não havia o que comer e beber.
No desespero da difícil sobrevivência,
as pessoas se agrediam umas às outras,
ninguém se entendia, tudo virava uma guerra.
As pessoas começaram a morrer aos montes.
Instalada ali no povoado, a Morte vivia rondando todos,
especialmente as pessoas fracas, velhas e doentes.
A Morte roubava essas pessoas e as levava para o outro mundo,
longe da família e dos amigos.
A Morte tirava a vida delas.
Na aldeia morria-se de todas as causas possíveis:
de doença, de velhice, e até mesmo ao nascer.
Morria-se afogado, envenenado, enfeitiçado.
Morria-se por causa de acidentes,
maus-tratos e violência.
Morria-se de fome, principalmente de fome.
Mas também de tristeza, de saudade
e até de amor.
A Morte estava fazendo o seu grande banquete.
Havia luto em todas as casas.
Todas as famílias choravam seus mortos.

O rei mandou muitos emissários falar com a malvada,
mas a Morte sempre respondia que não fazia acordos.
Que ia destruir um por um, sem piedade.
Se alguém fosse forte o suficiente para enfrentá-la, que tentasse,
mas seu fim seria ainda muito mais sofrido e penoso.
Ela mandou dizer ao rei, por fim:
“Para não dizerem que sou muito rabugenta,
até concordo em dar uma chance à aldeia.”
E ria e escarrava ao mesmo tempo, dizendo:
“Basta que uma pessoa me obrigue a fazer o que não quero.
Se alguém aqui me fizer agir contra a minha vontade,
eu irei embora.”
Depois, cuspindo nos seus interlocutores, completou:
“Ma só vou dar essa oportunidade a uma única pessoa.
Não vou dar nem a duas, nem a três.”
E foi-se embora dali,
saboreando antecipadamente mais uma vitória.

Mas quem se atreveria a enfrentar a Morte?
Quem, se os mais bravos guerreiros estavam mortos
ou ardiam de febre em suas últimas horas de vida?
Quem, se os mais astutos diplomatas havia muito tinham partido?
Foi então que dois meninos, os Ibejis,
os irmãos gêmeos Taió e Caiandê,
que os fofoqueiros da cidade diziam ser filhos de Ifá,
resolveram pregar uma peça na horrenda criatura.
Antes que toda a aldeia fosse completamente dizimada,
eles resolveram dar um basta aos ataques da Morte.
Decidiram os Ibejis:
“Vamos dar um chega-pra-lá nessa fedorenta figura.”

Os meninos pegaram o tambor mágico, que tocavam como ninguém,
e saíram à procura da Morte.
Não foi difícil achá-la numa estrada próxima,
por onde ela perambulava em busca de mais vítimas.
Sua presença era anunciada, do alto, por um bando de urubus
que sobrevoavam a incrível peçonhenta.
E o cheiro, ah, o cheiro!
A fedentina que a Morte produzia à sua volta
faria vomitar até uma estatueta de madeira.
Os meninos se esconderam numa moita
e, tapando o nariz com um lenço,
esperaram que ela se aproximasse.
Não tardou e a Morte foi chegando.
Os irmãos tremeram da cabeça aos pés.
Ainda escondidos na moita,
só de olhar para ela sentiram
como os pêlos dos seus braços se arrepiavam.
A pele era branca, fria e escamosa;
o cabelo, sem cor, desgrenhado e quebradiço.
Sua boca sem dentes expelia uma baba esbranquiçada e purulenta.
Seu hálito era de um fedor tremendo.
Mas podia-se dizer que a Morte estava feliz e contente.
Ela estava até cantando!
Pudera, tendo ceifado tantas vidas
e tendo tantas outras para extinguir.
Mas o canto da Morte era tão cavernoso e desafinado
que os passarinhos que ainda sobreviviam
silenciavam como se fossem mudos brinquedos de pedra.
O canto da Morte, se é que podemos chamar aquele ruído de canto,
era tão desconfortável e medonho
que os cachorros esqueléticos uivavam feito loucos
e os gatos magrelos bufavam e se arrepiavam todos.
Nesse momento, numa curva do caminho,
enquanto um dos irmão ficava escondido,
o outro saltou do mato para a estrada,
a poucos passos da Morte.
Saltou com seu tambor mágico,
que tocava sem cessar, com muito ritmo.
Tocava com toda a sua arte, todo o seu vigor.
Tocava com determinação e alegria.
Tocava bem como nunca tinha tocado antes.
A Morte se encantou com o ritmo do menino.
Com seu passo trôpego, ensaiou um dança sem graça.
E lá foi ela, alegre como ninguém,
dançando atrás do menino e de seu tambor,
ele na frente, ela atrás.
O espetáculo era grotesco,
a dança da Morte era, no mínimo, patética.
Nem vou contar como foi a cena:,
cada um que imagine por conta própria.
E é bem fácil imaginar.
Bem; lá ia o menino tocador
e atrás ia a Morte.
Passou-se uma hora, passou-se outra e mais outra.
O menino não fazia nenhuma pausa
e a Morte começou a se cansar.
O sol já ia alto, os dois seguiam pela estrada afora,
e o tambor sem parar, tá tá tatá tá tá tatá.
O dia deu lugar à noite
e o tambor sem parar, tá tá tatá tá tá tatá.
E assim ia a coisa, madrugada adentro.
O menino tocava, a Morte dançava.
O menino ia na frente, sempre ligeiro e folgazão.
A Morte seguia atrás, exausta, não agüentando mais.
“Pára de tocar, menino, vamos descansar um pouco”,
ela disse mais de uma vez.
Ele não parava.
“Pára essa porcaria de tambor, moleque,
ou hás de me pagar com a vida”,
ela ameaçou mais de uma vez.
E ele não parava.
“Pára que eu não agüento mais”, ela implorava.
E ele não parava.
Taió e Caiandê eram gêmeos idênticos.
Ninguém sabia diferenciar um do outro,
muito menos a Morte, que sempre foi cega e burra.
Pois bem, o moleque que a Morte via tocando na estrada sem parar
não era sempre o mesmo menino.
Uma hora tocava Taió, enquanto Caiandê seguia por dentro do mato.
Outra hora, quando Taió estava cansado,
Caiandê, aproveitando um curva da estrada, substituía o irmão no tambor.
Taió entrava no mato e acompanhava a dupla sem se deixar ver.
No mato o irmão que descansava podia fazer xixi,
beber a água depositada nas folhas dos arbustos,
enganar a fome comendo frutinhas silvestres.
Os gêmeos se revezavam e a música não parava nunca,
não parava nem por um minuto sequer.
Mas a Morte, coitada, não tinha substituto,
não podia parar, nem descansar, nem um minutinho só.
E o tambor sem cessar, tá tá tatá tá tá tatá.
Ela já nem respirava:
“Pára, pára, menino maldito.”
Mas o menino não parava.
E assim foi, por dias e dias.
Até os urubus já tinham deixado de acompanhar a Morte,
preferindo pousar na copa de umas árvores secas.
E o tambor sem parar, tá tá tatá tá tá tatá,
uma hora Taió, outra hora Caiandê.
Por fim, não agüentando mais, a aparição gritou:
“Pára com esse tambor maldito
e eu faço tudo o que me pedires.”
O menino virou-se para trás e disse:
“Pois então vá embora e deixe a minha aldeia em paz.”
“Aceito”, berrou a nauseabunda, vomitando na estrada.
O menino parou de tocar e ouviu a Morte dizer:
“Ah! que fracasso o meu.
Ser vencida por um simples pirralho.”
Então ela virou-se e foi embora.
Foi para longe do povoado, mas foi se lastimado:
“Eu me odeio. Eu me odeio.”
Só as moscas acompanhavam a Morte,
circundando sua cabeça descarnada.
Tocando e dançando,
os gêmeos voltaram para a aldeia
para dar a boa notícia.
Foram recebidos de braços abertos.
Todos queriam abraçá-los e beijá-los.
Em pouco tempo a vida normal voltou a reinar no povoado,
a saúde retornou às casas e a alegria reapareceu nas ruas.
Muitas homenagens foram feitas aos valentes Ibejis.
Mesmo depois de transcorrido certo tempo,
sempre que Taió e Caiandê passavam na direção do mercado,
havia alguém que comentava:
“Olha os meninos gêmeos que nos salvaram.”
E mais alguém complementava:
“Que a lembrança de sua valentia
nunca se apague de nossa memória.”
Ao que alguém acrescentava:
“Mas eles não são a cara do Adivinho?”


domingo, 13 de junho de 2010

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Conferência defende cota para negros na TV


Brasília, 10/11/2009

Evento que mobilizou ativistas e membros do governo propõe regra para garantir a negros e índios 20% das vagas em rádio e televisão

DAYANNE SOUSA

Conferência que reuniu ativistas e membros do governo aprovou a criação de cotas para artistas e jornalistas negr@s no rádio e na televisão. A II CONAPIR (Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial) propôs que negr@s e indígenas sejam 20% das equipes de rádio e televisão e 30% do elenco de propagandas do governo.

As resoluções da Conferência servem de orientação para tomadas de decisões no governo. Durante a CONAPIR, foram aprovadas 761 medidas, em áreas como saúde, educação, segurança e cultura.

O relatório final da CONAPIR não determina de que forma a cota seria estipulada. O texto diz apenas que deve-se “garantir uma política de participação de 20% de negr@s, povos indígenas e outras etnias discriminadas”. Para Vera Barcellos, do Núcleo de Jornalistas Afro-brasileir@s do Rio Grande do Sul, é preciso que as cotas virem lei. As empresas de comunicação seriam obrigadas a contratar um determinado percentual de negr@s e índios. “No momento, o país não oferece igualdade, só regulando a mídia para ela ser mais democrática”, diz Vera.

“Hoje, no Rio Grande do Sul, temos apenas dois jornalistas negros nas bancadas da televisão”, conta, “nem nos canais comunitários e fechados há espaço”.

O texto da CONAPIR, que ocorreu de 25 a 28 de junho, vai ao encontro de ideais consolidados recentemente no Estatuto da Igualdade Racial, aprovado no Congresso. O documento determina que “na produção de filmes e programas destinados à veiculação pelas emissoras de televisão e em salas cinematográficas, deverá ser adotada a prática de conferir oportunidades de emprego para atores/atrizes, figurantes e técnic@s negr@s”.

O relatório da Conferência destaca ainda que @s negr@s atuem também em papéis principais. “Não é só ter uma Helena negra”, afirma Vera, se referindo à protagonista de Viver a Vida, da Rede Globo, interpretada pela atriz Taís Araújo. “Ela é a principal, mas a sua família não é do primeiro núcleo, ela vive com um homem rico e branco”, observa.

Outra proposta para os meios de comunicação obriga-os a veicular programas sobre a cultura africana. A ideia é que 20% da programação seja voltada para esses temas.

A CONAPIR é um modelo de conferência que permite a participação do público em assuntos de políticas públicas. Numa primeira fase, pequenas reuniões com entidades comunitárias e administrações municipais e estaduais levantaram propostas. Todas elas foram discutidas em plenário em Brasília, que determinou as que iriam para o relatório final.

Desigualdade entre negros e brancos cai na educação, mas com pouco impacto na renda


Brasília, 05/04/2010

Matrícula escolar e analfabetismo entre jovens melhoram mais para pret@s e part@s; diferença entre ganhos no trabalho tem leve recuo.

As disparidades entre negr@s e branc@s têm diminuído na educação, mas isso ainda não se refletiu em queda da desigualdade de renda na mesma proporção, indica o quarto Relatório Nacional de Acompanhamento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, lançado pelo governo federal no fim de março, em Brasília.

Entre a população que trabalha, o rendimento de pret@s ou pard@s melhorou um pouco mais que o d@s branc@s, e a inequidade caiu. Na população como um todo a pobreza encolheu, mas a redução foi semelhante entre os dois grupos — a desigualdade, portanto, se manteve. Na avaliação do estudo, “os dados indicam a persistência de práticas de discriminação”.

A diminuição do abismo entre branc@s e negr@s (pret@s ou pard@s) não é um Objetivo do Milênio específico — aliás, a ausência de um enfoque sobre as desigualdades em geral nos ODM é alvo de críticas de estudiosos. No entanto, representantes da ONU no Brasil têm destacado a importância de que as metas sejam atingidas para todos os grupos. "O gênero, a raça, a etnia e o local de nascimento de uma criança brasileira ainda determinam, em grande parte, suas oportunidades futuras. Essas desigualdades têm repercussões diretas também na saúde da mulher e na razão da mortalidade materna", afirma a coordenadora-residente interina do Sistema das Nações Unidas no Brasil, Marie Pierre Poirier, na apresentação do relatório.

O estudo mostra que a tendência de universalização do ensino fundamental — uma política mais geral, não voltada a determinadas etnias especificamente — beneficiou negr@s e branc@s. Em 1992, o percentual de pessoas de 7 a 14 anos que frequentavam o ensino fundamental era de 75,3% para pret@s ou pard@s e 87,5% para branc@s. Já em 2008, as porcentagens eram praticamente iguais: 94,7% no primeiro caso e 95,4% no segundo.

Um dos efeitos disso foi a queda da desigualdade no analfabetismo. Na faixa etária de 15 a 24 anos, a taxa era de 95,6% para @s branc@s e 86,8% para @s negr@s, em 1992. Já em 2008 os números eram parecidos: 98,7% para @s branc@s, 97,3% para pret@s ou pard@s.

No ensino médio a desigualdade ainda persiste, embora em nível menor. Em 1992, a proporção de branc@s de 15 a 17 anos matriculados no antigo colegial (27,1%) era quase o triplo da d@s negr@s (9,2%). Em 2008, a diferença havia caído para 44% (61% entre @s branc@s, 42,2% entre pret@s ou pard@s). Quanto se adiciona o componente gênero, porém, a questão se agrava. "As negras frequentam menos as escolas, apresentam menores médias de anos de estudo e maior defasagem escolar", afirma o estudo.

Rendimentos

Se o perfil educacional de negr@s e branc@s ficou mais parecido, poderia se esperar que o mesmo acontecesse com o rendimento. Não é o que tem ocorrido. A distância entre trabalhador@s branc@s e @s pret@s ou pard@s diminuiu, mas ainda é grande. Em 2008, estes últimos recebiam somente 56,7% da remuneração dos primeiros, enquanto dez anos antes o percentual era de 48,4%. "Tal diferencial se deve, em grande medida, à menor escolaridade média da população preta e parda, que, no entanto, não é suficiente para explicar as diferenças de rendimentos", afirma o relatório.

O confronto dos dados de 1998 com os de 2008 mostra que, nos dez anos e para todas as faixas de escolaridade, @s pret@s ou pard@s sempre estiveram em situação pior na população ocupada. Ao longo desse período, a desigualdade caiu entre quem tem até 4 anos de estudos ( no máximo o antigo primário, portanto) e quem tem de 9 a 11 anos de estudos (ensino médio completo ou incompleto). Mas não mudou entre trabalhadores com 5 a 8 anos de estudos (antigo ginásio completo ou incompleto) e aumentou entre os que têm superior completo e incompleto.

Quando se leva em conta não apenas os trabalhadores, mas toda a população, a desigualdade se mostra estável. O relatório aponta que, em 1990, 37,1% d@s pret@s ou pard@s viviam abaixo da linha de extrema pobreza do Banco Mundial (US$ 1,25 ao dia, em dólar calculado pela paridade do poder de compra, que desconta as diferenças de custo de vida entre os países). Em 2008, a proporção havia caído para 6,6% — um recuo de 82% no período. Entre os branc@s, a queda foi semelhante (83%): de 16,5%, em 1990, para 2,8%, no ano retrasado.

Os números mostram, portanto, que a proporção de pessoas muito pobres entre @s negr@s é mais que o dobro que entre @s branc@s. Sob esse ponto de vista, a desigualdade racial abre um fosso de cinco anos entre os dois grupos: a extrema pobreza de pretos e partos de 2008 era a mesma que a de brancos de 2003. Como afirma o estudo, apesar dos avanços "o objetivo da igualdade racial requereria uma queda mais acelerada da pobreza extrema entre pret@s ou pard@s".

Fonte:http://www.pnud.org.br/raca/index.php?lay=rac

Negr@ morre mais de 'causa indefinida'.

Rio de Janeiro, 26/10/2006


Proporção de pretos e pardos com causa de morte mal definida é quase o dobro da registrada para brancos; especialistas vêem racismo.

ALAN INFANTE

A proporção de pret@s e pard@s com causa de morte mal definida foi quase o dobro da registrada entre os brancos em 2004. O atestado de óbito de 16,1% dos negr@s (13,2% das pessoas de cor preta e 16,8% das de cor parda) que faleceram naquele ano não deixa escuro o que provocou a morte, enquanto para os brancos o percentual é de 8,7%. O Ministério da Saúde, que disponibiliza os dados através do Datasus, atribui a diferença a um erro protocolar d@s médic@s, que não especificam, no atestado, o motivo do falecimento. Algumas especialistas em saúde vêem nos números um forte indício de discriminação racial no atendimento. Para elas, o dado sugere que é maior o percentual de negr@s que morrem sem receber assistência médica.

A diferença estatística é o resultado da discriminação racial dos serviços de saúde, afirma a psicanalista Marta de Oliveira, da Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro. “Tudo indica que isso está ligado à falta de acesso à saúde a que a população negra está exposta”, comenta. Segundo ela, grande parte das mortes com causa mal especificada poderia ter sido evitada com cuidados médicos simples, como pré-natal.

“As negras têm menor acesso ao pré-natal e, quando têm, o pré-natal que elas fazem é de baixa qualidade. Por isso, a mortalidade das gestantes negras é maior. Só isso já mostra o quanto é defasada a saúde para os negros, pois a mortalidade materna é emblemática nesse sentido. Ela indica a qualidade da assistência de maneira geral”, afirma. “A diferença nos dados é apenas o final dessa cadeia de desassistência”, completa.

A pesquisadora Sony Santos, sanitarista da Diretoria de Vigilância em Saúde da Secretaria de Saúde do Recife, concorda com Marta. Para ela, a desigualdade nos números é reflexo da baixa qualidade do atendimento a que pret@s e pard@s têm acesso. “Há diferença na atenção a branc@s e negr@s. Existem estudos científicos que mostram isso. Um trabalho da pesquisadora Maria do Carmo Leal, da Fiocruz [Fundação Oswaldo Cruz], mostra que, no Rio de Janeiro, a quantidade de anestésico aplicada nas gestantes negras na hora do parto é menor do que a aplicada nas brancas. Exatamente porque existe uma cultura de que as negras suportam mais a dor”, afirma.

Além da distinção na assistência médica oferecida a branc@s e negr@s, a maior exposição d@s negr@s à violência influencia essa diferença de taxas, segundo a pesquisadora. “@s negr@s, por serem na maioria pessoas de baixa renda, estão mais expostos à violência. Muitos deles são vítimas de homicídio e enterrados sem passar pelo IML [Instituto Médico Legal] ou pelo Serviço de Verificação de Óbito. Não há interesse na verificação da causa de morte. Daí a falta de informação”, declara.

Para advertir os gestores e profissionais de saúde sobre o problema racial na assistência médica e incentivar ações de melhoria do atendimento para pret@s e pard@s, organizações do movimento negro de todo o país estabeleceram, com o apoio do PCRI (Programa de Combate ao Racismo Institucional, desenvolvido pelo governo federal com o apoio do PNUD), 27 de outubro como Dia Nacional de Mobilização Pró-Saúde da População Negra. A definição da data tem o objetivo de alertar sobre o problema da discriminação na saúde e de desencadear uma série de ações voltadas à melhoria da assistência médica a que @s negr@s têm acesso. Estão programadas atividades como palestras e seminários em secretarias de Saúde estaduais e municipais.

Eventos combatem discriminação no Estado


Raça

Brasília, 11/05/2010

Seminários reunirão servidores estaduais e municipais para destacar importância de evitar práticas contra grupos como negros e mulheres.
Os seminários serão organizados por seis agências da ONU e dois ministérios. O primeiro está sendo feito em Brasília, com funcionários estaduais que lidam com políticas de promoção da igualdade racial e entre os sexos. Ainda neste ano, haverá eventos para municípios — pelo menos um seminário em cada uma das cinco regiões brasileiras.